Em Bemposta, o dia 29 de Junho, é dia Santo, em honra de S.
Pedro, seu padroeiro. De acordo com a tradição, aldeia e todas as suas
actividades, estão sob a protecção deste santo, que aliás têm o seu orago.
Como bons crentes, estas gentes festejavam o S. Pedro como
aquele que tem o poder de intervir junto de Deus. Por outro lado, sendo o
primeiro Papa, era ele que tinha o poder de mudar a organização das actividades
económicas e sociais. Marcava o tempo e a forma das revivências. Não admira que,
no tempo da profunda religiosidade, esta fosse a festa principal.
S. Pedro cumpre os desígnios plenos de Deus na terra. Tal como
no tempo mítico, o homem só se sentia liberto e abençoado se, neste dia, tomasse
as decisões adequadas à sua vida.
É neste dia que se fazem as grandes mudanças.
Mudam os criados e os amos, assim como os mordomos, que hão-de
servir a igreja.
No plano religioso,
durante a missa cantada, são anunciados os novos mordomos, para as diferentes
confrarias e santos da aldeia,
com excepção dos da festa de N.ª Sª. Prazeres e Santa
Bárbara, que são nomeados no dia da própria festa.
As regras estavam traçadas, ninguém se recusava
a servir os santos que lhe tocassem, nesse ano. A Junta da Comissão Fabriqueira
nomeava, seguindo a ordem das ruas ou de alguma promessa. O fervor e a devoção
eram uma obrigação, em que, quem se recusasse a servir, era banido do convívio e
da solidariedade. Todos consideravam uma honra servir os santos venerados na
aldeia, quer na igreja, quer fazendo o peditório no “Domingo cabo de ano”.
Os mordomos das principais irmandades ou confrarias eram
verdadeiros guardiães da igreja e das suas necessidades. A trindade dos mordomos
principais era constituída pelos mordomos de S. Pedro, de Nosso Senhor e das
Almas.
Eram eles que tocavam às Trindades, às Ave-Marias e às Almas.
Da mesma forma, acendiam as velas na missa e acompanhavam o pároco, nas
procissões, nos funerais, e na visita pascal, com a cruz e as lanternas.
Ao mordomo das Almas incumbia, ainda, organizar o “paga vinho”
e a fogueira dos fiéis, dia 1 de Novembro.
Tradicionalmente, o dia 29 de Junho, era o dia em que o senhor
Bispo da diocese visitava o rebanho que apascentava nesta terra fértil de
Bemposta e as crianças eram crismadas.
É neste dia (29) que termina a
catequese, que se fez durante o ano, e se realiza a 1ª comunhão solene das
crianças.
No plano profano, esta festa nunca foi além do convívio entre
paroquianos, quer com jogos tradicionais, quer nas adegas entre amigos.
O contracto anual de trabalho, como criado com o mesmo amo, ou
se renova, por mais um ano, ou se vai à procura de novo amo. Os criados faziam
contas com os amos cessantes e ajustavam-se com novos amos. Aquele que queria
mudar, claro.
O tempo das ceifas estava a chegar. Aqui se combinavam as
ceifas e a torna-jeira. Por isso, era preciso retemperar as forças para os dias
de sol-a-sol, agarrados à fouce ou a fazer a acarreja dos molhos de cereal para
as eiras.
Porém, o sentido da religiosidade muda ao longo dos tempos. O
sentido de protecção divina já não está no fervor e na devoção à igreja. Outras
“ igrejas” se foram criando. O sentido materialista da vida toma conta das
preocupações do homem moderno.
Hoje, a Comissão Fabriqueira da Igreja tem dificuldades em
encontrar famílias que queiram ser mordomos. Já não há disponibilidade para
servir o sagrado tradicional. A religiosidade já não é o que era. Os casais
jovens não sentem a religiosidade que os seus antepassados sentiam. Mudam-se os
tempos, mudam-se os seres e as vontades.
Por estes motivos e para que as tradições fundamentais não se
percam, na aldeia, a Junta de Freguesia, tomou a decisão de assumir os festejos
de S. Pedro.
Se a parte religiosa continua a ser da responsabilidade do
pároco da freguesia, já a parte profana foi recriada pela Junta de Freguesia.
Assim, há uns anos a esta parte, na sequência dos santos populares, passou a
fazer-se um arraial com grupo musical, acompanhado por uma sardinhada, pão e
vinho para todos.
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