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A BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO DOURO:
SUA IMPORTÂNCIA PARA A CONSERVAÇÃO DA POPULAÇÃO PORTUGUESA DE AVES DE RAPINA
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RESUMO
A
bacia do Rio Douro, desde Miranda do Douro até quase à sua foz, constitui um dos
últimos refúgios e local de nidificação de várias espécies de aves de rapina.
Não obstante profundas alterações provocados no habitat pela acção
humana, introduzindo sistemas de monocultivo agrícolas - vinha fundamentalmente
- quer constituindo barragens e vias de comunicações, uma percentagem
considerável da população portuguesa de gritos, abutre-do-Egipto,
águia-de-Bonelli e falcão peregrino vive no Douro ou nos seus afluentes.
O Grupo
Quercus tem dedicado um especial carinho ao recenseamento e protecção destas
aves, tendo criado e vindo a manter em funcionamento a zona de alimentação de
abutres de Miranda do Douro.
I
Uma
parte significativa das espécies de aves de rapina nidificantes no território
nacional, constroem o seu ninho em paredes rochosas, mais ou menos verticais, de
maior ou menor dimensão. As margens do rio Douro e seus afluentes,
fundamentalmente a montante de Peso da Régua, possuem importantes núcleos de
escarpas fluviais, que albergam ainda hoje uma percentagem significativa da
população portuguesa de aves de rapina rupícolas.
Um
núcleo de ornitólogos amadores portugueses, hoje em grande parte agrupados no
GRUPO QUERCUS - Grupo para a Recuperação da Floresta e Fauna Autóctones -, tem
dedicado um carinho e uma atenção muito grande à avifàuna do rio Douro - quer
nacional quer internacional - e aos seus afluentes e subafluentes mais ricos do
ponto de vista faunístico: Corgo, Tua, Tuela, Sabor, Maçãs, Angueira, Távora,
Côa e Agueda.
Mercê
desse trabalho é já hoje possível ter uma ideia aproximada da população das
várias espécies de rapinas da bacia do Douro e a percentagem com que contribuem
vara a população nacional dessas aves.
Atentemos no quadro seguinte:
Espécie de Ave de Rapina
|
Bacia rio Douro |
População Nacional
|
Média
Percentual
|
Abutre-do-Egipto
Neophron percnopterus |
+-30 |
40/50 |
65% |
Grifo
Gyps fulvus |
+-80 |
90/100 |
85% |
Águia-real
Aquila chrysaetos |
15/20 |
+-25 |
70% |
Águia-de-Bonelli
Hieraaetus fasciatus |
16/25 |
35/50 |
40% |
Falcão-peregrino
Falco peregrines |
15/30 |
40/80 |
35% |
Infere-se da análise do quadro a enorme importância que a bacia do Douro tem
para a conservação de duas espécies fundamentais da nossa avifauna: a águia-real
e o grifo, possuindo o Douro e os seus afluentes, respectivamente 70 e 85 por
cento das populações nacionais dessas espécies.
Estas
duas espécies são, de todas as referidas no quadro, precisamente as de maior
envergadura - cerca de 2,70 metros para o grifo e 2,30 para a águia-real - sendo
portanto aves que dificilmente passam despercebidas nas zonas onde ainda
ocorrem, e só subsistindo onde a altura das escarpas onde se abrigam e criam, é
de molde a dissuadir qualquer tentativa de assalto ' aos ninhos por parte do
homem.
A bacia
do Douro, e fundamentalmente os 120 km quase ininterruptos de boas escarpas
entre as quais corre o Douro internacional no seu percurso de Miranda do Douro
até Barca d'Alva, constitui a mais importante zona de nidificação de aves de
rapina no nosso país,
A
riqueza faunística da bacia do Douro, no entanto, e no que se refere a aves de
rapina, não se restringe às 5 espécies mencionadas. Nas suas Margens ocorrem, e
em grande parte criam, populações importantes das seguintes espécies:
Águia-imperial, Aquila heliaca adalberti
Águia-calçada, Hieraaetus pennatus
Águia
cobreira, Circaetus gallicus
Águia-de-asa-redonda, Buteo buteo
Açor,
Accipiter gentilis
Gavião-da-Europa, Accipiter nisus
Milhano,
Milvus milvus
Milhafre-preto, Milvus migraNS
Águia-pesqueira, Pandion haliaetus
Águia-caçadeira, Circus pygargus
Peneireiro-de-dorso-malhado, Falco tinnunculus
II
Logo que
tomou consciência da importância efectiva do Douro para a sobrevivência das aves
de rapina em Portugal, o GRUPO QUERCUS tem procurado tomar iniciativas concretas
de conservação, que ultrapassem o estádio inicial da mera inventariação e
localização dos casais nidificantes.
As
medidas mais espectaculares e bem sucedidas terão sido as da criação de zonas de
alimentação para aves necrófagas. Os abutres alimentam-se quase exclusivamente
de animais mortos, sendo incapazes, de uma forma geral, de capturar presas
vivas.
Estão,
dessa forma, totalmente dependentes dos animais domésticos que morrem nos
campos. Quando detectam o cadáver de alguma vaca ou ovelha juntam-se por vezes
em grande número, e devoram a carcaça mais ou menos rapidamente, contribuindo
desse modo para a eliminação na natureza desses cadáveres que de outro modo
poderiam constituir focos infecciosos, contagiando o gado doméstico e os animais
selvagens, nomeadamente as espécies cinegéticas.
No
entanto, a pastorícia e a criação de gado atravessam altos e baixos, e é hoje
bem menor do que há décadas, o número de cabeças criadas em liberdade. Também a
criação de gado cavalar e asinino decresceu bastante com o surgimento dos
modernos meios de transporte e de amanho da terra.
Acresce
a tudo isto, a norma jurídica, felizmente nem sempre acatada pelos pastores, que
obriga ao encerramento dos cadáveres de animais que morrem nos campos, por
motivos de ordem sanitária.
Desse
modo, as populações sobreviventes de grifos e abutres-do-egipto nem sempre
dispõem de alimento na quantidade necessária e com a regularidade desejável.
Procurou-se, pois, minorar a escassez de alimento colocando à disposição dos
abutres, por um lado as vísceras e partes não aproveitáveis dos animais abatidos
nos matadouros, e por outro, animais inteiros considerados impróprios para
alimentação humana, mas que o respectivo médico veterinário tenha entendido não
sofrerem de nenhuma doença contagiosa que contra-indicasse o seu lançamento aos
abutres.
Concomitantemente, lançou-se junto das populações uma campanha, que ainda
decorre, e que visa reabilitar a imagem dos nossos abutres, realçando aos olhos
dos pastores e agricultores o papel ecológico importante que os abutres
desempenham na natureza como saneadores dos nossos campos, e ao mesmo tempo
convidando-os a oferecer as reses que lhes vão morrendo para abastecer as zonas
de alimentação.
Uma
dessas zonas de alimentação de abutres foi criada no concelho de Miranda do
Douro e funciona desde Janeiro de 1985. Com a colaboração indispensável da
Câmara Municipal de Miranda do Douro e do respectivo Matadouro, bem como do
médico veterinário e de alguns lavradores mirandeses, foi possível lançar desde
então aos abutres, cerca de 15 toneladas de vísceras e animais inteiros.
III
O rio
Douro, no seu curso superior, e os referidos afluentes, atravessam, em
território nacional, uma zona onde a indústria é praticamente inexistente e onde
a pouca densa e muito concentrada população vive fundamentalmente de uma
agricultura pobre e de uma criação de gado nem sempre bem orientada. É, desse
modo, uma das regiões do nosso país onde o equilíbrio natural foi menos alterado
pela acção humana.
Existem,
no entanto, acções, algumas delas perfeitamente evitáveis, que põem em causa
esse equilíbrio e a preservação desse riquíssimo património.
Passamos
a enunciar sucintamente algumas das que nos parecem ser mais importantes como
factores de desequilíbrio natural:
a) A
construção de barragens
O
curso nacional e internacional do Douro está já hoje completamente aproveitado
do ponto de vista de produção de energia eléctrica. O mesmo se não poderá dizer
dos seus afluentes estando prevista a construção de barragens hidroeléctricas,
pelo menos, nos rios Sabor e Côa. Importante seria que tais empreendimentos não
fossem executados sem a elaboração de estudos prévios que permitissem minimizar
o impacto dessas obras no ambiente. Outro problema que os aproveitamentos
hidroeléctricos acarretam para as aves de rapina é a proliferação de cabos
eléctricos de alta tensão que constituem um perigo permanente de colisão e
electrocussão. Conviria, pois, corrigir a trajectória de linhas de alta tensão
já existentes e ter estes factores em conta aquando da construção de novos
cabos. Deveria, também, ser reformulado o formato dos postes eléctricos,
aproveitando a grande experiência que nesse domínio possuem companhias
hidroeléctricas estrangeiras, de forma a diminuir ou a anular os riscos de morte
por electrocussão das aves de rapina.
b) Práticas agrícolas de monocultura extensiva e a florestação de espécies
exóticas.
Deveriam
ser privilegiadas formas de desenvolvimento agrícola e pecuário que se
compatibilizassem o mais possível com o equilíbrio natural. A criação de gado e
nomeadamente a criação de ovinos parece-nos ser uma forma de aproveitar os
recursos locais sem perturbar o equilíbrio natural dessa zona.
Relativamente à florestação com espécies exóticas a região do Alto Douro e
Trás-os-Montes tem sido relativamente poupada ao avanço indiscriminado das
plantações de eucalipto. Há no entanto sintomas de que a florestação com
pinheiros bravos está a avançar em algumas zonas do curso superior do Sabor.
Tais práticas de monocultivo florestal com espécies exóticas poderá pôr em causa
a sobrevivência de várias espécies cinegéticas e a manutenção de certas práticas
pastoris, determinando o desaparecimento, nessas zonas, de importantes espécies
de aves de rapina.
c) Caça indiscriminada e ilegal
Outro grave problema é a caça indiscriminada e ilegal que ainda hoje se verifica
por toda a zona, matando as espécies que servem de alimento às rapinas, bem como
as próprias aves de rapina, que aparecem a decorar por toda a região, montras e
escaparates de estabelecimentos comerciais. Imperioso se torna, pois,
regulamentar e fiscalizar a actividade nefasta dos chamados taxidermistas, e por
outro lado, gerir os recursos cinegéticos de uma forma mais racional, criando
reservas de caça nos territórios das principais espécies de aves de rapina,
protegendo da caça as zonas envolventes das escarpas de nidificação, e em
algumas zonas possibilitando apenas às populações locais o exercício da caça.
d) Exercícios militares
Perfeitamente desnecessários e evitáveis nas zonas de modificação são os
exercícios militares. Realizaram-se há tempos, no planalto mirandês, exercícios
militares conjuntos entre os dois países ibéricos que envolveram a participação
de meios aéreos dos dois países e de centenas, senão mesmo milhares de homens.
Foram efectuados exercícios de fogos reais incluindo disparos de artilharia em
plena zona de modificação de importantes espécies de rapinas.
e) Alpinismo
Convém
também regulamentar a prática de alpinismo, que ainda que não atinja para já
proporções alarmantes no nosso país, é já factor importante de perturbação em
zonas muito utilizadas do Penêdo Durão, no concelho de Freixo de Espada-à-Cinta.
IV
Muitos
outros factores de perturbação poderiam ser apontados. Algumas zonas da bacia do
Douro são, não obstante a actividade humana, bastiões fundamentais para a
preservação de importantes aves de rapina no nosso país. Quaisquer projectos de
desenvolvimento que se elaborem para a região deverão atender a esses valores,
sob pena de nos vermos privados de um importante património natural de interesse
mundial.
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2
Espécies em vias de extinção ameaçadas
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Doença
hemorrágica viral nos coelhos no PNDI põe em causa sobrevivência de aves de
rapina
Uma
epidemia da doença hemorrágica viral reduziu drasticamente a população de
coelhos no Parque Natural do Douro Internacional, pondo em risco várias espécies
protegidas de aves de rapina e outros predadores. O coelho é a base da cadeia
alimentar da águia-real e da águia de Bonelli, entre outros, que enfrentam este
ano um grande teste de sobrevivência face à escassez de alimento. Na origem
desta situação está a «forte pressão» cinegética e a diminuição da importância
da agricultura tradicional na área.
Um surto
devastador da doença hemorrágica viral na população de coelhos do
Parque Natural do Douro Internacional
poderá pôr em risco as principais espécies da fauna, muitas delas em vias de
extinção, daquela área protegida e que foram um dos fundamentos para a sua
criação há três anos atrás. Aves de rapina como a águia-real, a águia de Bonelli,
também conhecida por águia-perdigueira, e outros predadores enfrentam este ano
um grande teste de sobrevivência face à escassez de alimento. Em risco estão
ainda a raposa, a gineta, a fuinha, o açor, o abutre do Egipto e a águia-calçada,
na medida em que o coelho é a base da cadeia alimentar de todas estas espécies
existentes no PNDI.
«Assistiu-se
a uma redução quase completa dos coelhos em algumas áreas do parque», refere
António Monteiro, biólogo do PNDI, lembrando que este é o «pico mais baixo» da
densidade daquela população na zona de Figueira de Castelo Rodrigo, onde algumas
associações de caçadores deram o alerta para a diminuição desta espécie.
«Começaram a verificar que os repovoamentos funcionavam ao contrário», explica o
técnico, que aguarda agora pela reprodutividade das aves de rapina no corrente
ano para conhecer o impacto da redução da população de coelhos na sobrevivência
das várias espécies. No entanto, o futuro é visto com grande preocupação, já que
com a falta de alimento os casais reproduzem-se menos. «O parque do Douro
Internacional é um dos últimos redutos da águia de Bonelli em Portugal. Como a
população ibérica tem vindo a diminuir, esta espécie será neste momento a mais
ameaçada da região porque a sua taxa de reprodutividade é muito inferior a uma
cria por casal por ano», sublinha António Monteiro. Actualmente existem 14
casais de águias de Bonelli na área do PNDI, mas o facto daquela espécie ter
hábitos alimentares menos variados que os da águia-real, dependendo quase
exclusivamente do coelho, torna a situação ainda mais alarmante. A
águia-perdigueira é uma das espécies mais ameaçadas em Portugal, onde deverão
existir cerca de 85 casais, localizados principalmente no Nordeste transmontano.
O Douro Internacional e uma área balizada pelo Douro nacional, vales do Sabor,
do Côa e Águeda constituem os últimos santuários da espécie.
Para António
Monteiro, há «fortes indícios» de que esta redução drástica da população dos
coelhos seja uma consequência da «má gestão» dos povoamentos, nalguns casos
originados pela «forte pressão» cinegética, mas também devido ao desaparecimento
da agricultura tradicional naquela área. «É necessário maior rigor a nível dos
repovoamentos, que deveriam ser mais controlados e acontecerem apenas quando se
justificam. Por outro lado, haverá que abrir matas, recuperar sementeiras e
pontos de água para que os sobreviventes se possam aguentar. É deixar que a
própria Natureza recupere», explica o biólogo, que considera ser a altura ideal
para se realizarem estudos sobre a doença hemorrágica viral. «Não devemos
esperar por salvações milagrosas, pois já vimos que as vacinações e os
repovoamentos não funcionam», acrescenta. A doença hemorrágica viral ocorre todo
o ano e caracteriza-se por causar a morte repentina dos animais, dois a três
dias após a infecção, normalmente por asfixia, resultante de fortes hemorragias
nos órgãos internos. É uma doença altamente contagiosa e bastará um coelho
infectado para dizimar uma população. Neste momento, o Parque Natural do Douro
Internacional já conseguiu que algumas associações de caçadores parassem com os
povoamentos que não são controlados ou sem garantias de vacinação.
O PNDI é a
maior área protegida da Península Ibérica. Com cerca de 86 mil hectares, numa
extensão de 180 quilómetros ao longo dos rios Côa, Águeda, Sabor e Douro, o
parque é uma Zona de Protecção Especial (ZPE) para aves e integra a Rede Natura
2000, já que é um local privilegiado para grifos, águias reais, abutres do
Egipto e águias de Bonelli.
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3
NORDESTE TRANSMONTANO - AVIFAUNA RUPICOLA (dados ICN)
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ameaçadas |
não ameaçadas |
espécies
estritamente
nidificantes
rupícolas |
Cegonha-preta |
|
Britango |
|
Grifo |
|
Águia-real |
Andorinha-das-rochas |
Águia de Bonelli |
Melro-azul |
Falcão-peregrino |
|
Bufo-real |
|
Andorinhão-real |
|
Gralha-de-bico-vermelho |
|
|
|
|
espécies
ocasionalmente
nidificantes
rupícolas |
|
Peneireiro-de-dorso-malhado |
Chasco-preto |
Andorinha-daurica |
Corvo |
Andorinha-dos-beirais |
|
Gralha-de-nuca-cinzenta |
|
Pombo-das-rochas |
|
PNDI / ZPE DIVRA *
(2003) |
PNM /ZPE MN
(2003) |
ZPE RSM
(1997) |
ZPE VC
(2003) |
Outras áreas (1997) |
Total |
Cegonha-preta |
Ciconia nigra |
14 |
1 |
3 - 4 |
1 |
0 |
19-20 |
Britango |
Neophron percnopterus |
81 |
0 |
13 |
5 |
2 |
101 |
Grifo |
Gyps fulvus |
302 |
0 |
0 |
20 |
0 |
322 |
Águia-real |
Aquila chrysaetus |
21 |
4 |
14-16 |
4 |
3 |
46-48 |
Águia de Bonelli |
Hieraaetus fasciatus |
10 |
0 |
7 |
2 |
|
24 |
Falcão-peregrino |
Falco peregrinus |
10-15 |
1 |
0 |
0 |
|
10-20 |
Bufo-real |
Bubo bubo |
15-25 |
?? |
?? |
3-5 |
?? |
+ 18 |
Andorinhão-real |
Apus melba |
+ 100 |
0 |
?? |
+10 |
?? |
+ 110 |
Gralha-de-bico-vermelho |
Pyrrhocorax pyrrhocorax |
50-100 |
|
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4
Trás-os-Montes recupera 'santuário' de lagostins
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O rio Angueira, no Nordeste Trasmontano, poderá recuperar o estatuto de viveiro
natural de lagostins de água doce graças a um projecto em curso, cujos primeiros
resultados serão divulgados hoje.
O Angueira
foi em tempos o ex-líbris do lagostim de "Patas Brancas" que abundavam em todo o
leito do rio, agora reduzido a um pequeno curso de água com pouca profundidade.
Apurar as causas da sua extinção e saber se será possível repovoar novamente o
rio é a finalidade de um estudo iniciado há cerca de meio ano.
Toda a bacia
do rio está a ser estudada, enquanto se fazem experiências em cativeiro e
nalgumas zonas do rio sobre a reprodução e a capacidade de sobrevivência do
lagostim, de forma a saber se haverá condições para fazer repovoamentos e para o
seu desenvolvimento.
Na opinião
dos promotores, "este projecto tem um significado especial porque, além de se
propor recuperar uma tradição cultural desta zona, tem como filosofia dar vida
ao rio, invertendo o afastamento dos últimos anos em que a tendência é para
prejudicar os cursos de água, retirando areias e depositando lixo".
O lagostim de
"Patas Brancas" poderá ainda tornar-se numa fonte de receita para as populações
locais, com a particularidade de ser criado num habitat natural, ao invés da
maioria dos moluscos para consumo, que são criados em cativeiro. Contudo, as
capturas não poderão ser feitas de forma desmesurada.
Estas
suposições têm em conta o facto de esta espécie não existir em nenhuma zona do
país, tendo sido necessário recorrer à vizinha Espanha para arranjar alguns
exemplares para os estudos que se encontram em curso.
O rio
Angueira, que nasce em Espanha, na zona de Alcañices, atravessa os concelhos de
Miranda do Douro e
Vimioso e vai desaguar ao
rio Maçãs, próximo do concelho de
Mogadouro, foi em tempos ponto de encontro
de pescadores portugueses e espanhóis para a pesca do lagostim.
A falta de
corrente provoca, sobretudo durante o Verão, um elevado nível de poluição, que
terá sido a causadora do desaparecimento do lagostim de "Patas Brancas",
apreciado pelas gentes das comunidades de ambos os lados da fronteira.
"Se for
possível recuperar esta tradição do Angueira, uma das preocupações antes de
proceder ao repovoamento do rio passa pela sensibilização das populações, que
terão de abandonar algumas práticas para não prejudicar a espécie, nomeadamente
lavar pulverizadores de pesticidas no rio", disse Rui Caseiro, elemento ligado
ao projecto.
Um factor que
poderá condicionar o projecto, a confirmar-se que a poluição contribuiu de
alguma forma para a extinção da espécie, é o lançamento de esgotos no rio.
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Espécies ameaçadas no Parque Natural do Douro Internacional
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Águia "Bonelli"
e cegonha negra foram a principal motivação para a criação da área protegida
O
Parque Natural do Douro Internacional (PNDI)
está a desenvolver um projecto para a preservação e estudo da águia "bonelli" e
da cegonha preta, revelou o coordenador do projecto, António Monteiro. Aquelas
duas espécies constituíram a principal motivação para a criação da área
protegida, e "são as mais ameaçadas na área do parque", pelo que o projecto tem
como objectivo "criar condições para a sua preservação e dos seus habitats
naturais", acrescentou o biólogo António Monteiro.
O projecto
começará a ser executado em 2001 e terá uma duração de quatro anos, estando a
ser preparada uma candidatura ao programa comunitário "Life Natureza". Este
programa, que financia este tipo de iniciativas, poderá assegurar os 200 mil
contos necessários à concretização das diversas actividades previstas.
Garantir a
alimentação destas aves é - segundo o biólogo - um dos objectivos, pelo que "vai
proceder-se ao repovoamento da área do parque com coelhos e perdizes, em acções
coordenadas com as zonas de caça associativas".
O pombo é
outro dos alimentos predilectos destas aves, e, por isso, o projecto foi
associado a
um outro, já em curso, que visa a
recuperação de pombais na área protegida, contribuindo para o aumento da
produção e, em consequência da disponibilidade de alimento das águias.
Fiscalização e vigilância
"Pretendemos criar, inclusivé, um centro de produção de pombos, em colaboração
com a respectiva associação de produtores, que em princípio ficará localizado em
Freixo de Espada à Cinta, por ser o local que oferece as condições mais
adequadas", adiantou o biólogo.
O projecto
visa ainda fazer sementeiras por toda a zona e abrir pontos de água,
nomeadamente charcos e pequenas barragens, para assegurar a alimentação da
cegonha negra, uma ave que pesca para se alimentar.
O estudo das
duas espécies é outra das finalidades do projecto, que prevê oferecer aos
investigadores um maior conhecimento das aves, o que será feito através do
sistema de telemetria, já utilizado para estudar o lobo.
Este sistema
consiste em colocar nos animais uma pequena "mochila" (com cerca de 20 gramas)
com um emissor-rádio que, através de satélite, permitirá localizar as aves,
saber das suas movimentações e actividades e quais os seus percursos
migratórios.
A
fiscalização e vigilância é outra das preocupações dos responsáveis pelo
projecto, que será assegurada pela contratação de jovens da região, a quem será
entregue o controlo da área.
"Tudo isto é
importante também para as populações locais que vão ser beneficiadas com estas
acções, nomeadamente os pastores, que no Verão vão dispor de mais pontos de água
para dar de beber ao gado, e para os caçadores, que vão ter mais caça",
sublinhou António Monteiro.
O projecto
tem um âmbito internacional, envolvendo também o lado espanhol do Douro
Internacional, embora os espanhóis tenham optado por trabalhar na
preservação do morcego, uma espécie
considerada importante naquela zona, por ser um predador de diversos insectos e
pragas prejudiciais às culturas agrícolas.
Na
globalidade, este projecto abrange uma área de 200 mil hectares, 90 mil do
Parque Natural do Douro Internacional, no lado português, e 110 mil no lado
espanhol do Douro Internacional.
O canhão
fluvial do Douro apresenta uma grande quantidade de escarpas nas suas arribas
propícias à cegonha negra e à águia "bonelli", que atraem muitas pessoas a esta
zona, para ver os exemplares que têm sobrevivido às adversidades, nomeadamente
14 casais de águias e 15 de cegonhas.
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6
Projecto estuda burros em extinção
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"A menina é
dos apanhados?". Esta costuma ser a primeira reacção dos agricultores do
Parque Natural do Douro Internacional,
sempre que são abordados por uma jovem engenheira zootécnica, que anda a
"estudar os burros". Seleccionada pelo
Instituto da Conservação da Natureza,
Luísa Samões está a realizar um trabalho inédito e invulgar sobre os burros,
raça que se encontra em vias de extinção.
Em Janeiro,
partiu para o terreno, tendo-se já habituado a explicar que não traz nenhuma
câmara de filmar escondida e que se faz acompanhar apenas de um inquérito e da
curiosidade científica, para ouvir a voz experiente de quem lidou toda a vida
com a raça asinina.
"Se hoje
ainda existem burros em Portugal, não é pelo que se fez cientificamente para a
sua preservação, mas sim pelas características da nossa agricultura,
especialmente na região transmontana", afirma Luísa Samões. Os recenseamentos de
asininos, realizados de dez em dez anos, permitiram concluir que, desde 1940, o
número de burros diminuiu de 9000 para 4500.
Para essa
realidade, contribuiu o fenómeno da emigração e o consequente abandono das
terras, que teve como contrapartida a permanência de uma população idosa, que
ajudou a manter os exemplares ainda existentes, servindo-se deles para os
pequenos trabalhos da agricultura familiar. "Mesmo utilizando máquinas para
tratar das terras, as pessoas idosas vão ficando sempre com o burro", realça
Luísa Samões.
Para a
realização do estudo - que conta com o apoio de um professor da
Escola Superior Agrária de Bragança e de
uma técnica da Parque Natural do Douro Internacional - Luísa Samões escolheu uma
dezena de aldeias dos concelhos de
Miranda do Douro,
Freixo de Espada à Cinta,
Mogadouro e
Figueira de Castelo Rodrigo.
O propósito
deste trabalho é reunir elementos, com vista a encontrar uma raça indígena de
asininos que se distingua das outras que se julga ter existido nesta zona do
nordeste transmontano. "Na zona de Miranda do Douro, existe um tipo de animal
diferente, que é grande e forte, com o pescoço e peito largos, patas grossas e
muito pêlo, que se adapta às características das arribas da região", afirma a
investigadora.
"Desenvolver
esta raça vai ser um trabalho exigente, visto que os animais existentes já não
apresentam as características originais, resultado do cruzamento de diversas
raças", completa. Até ao final do ano, Luísa Samões pretende seleccionar alguns
animais-padrão, para começar a fase do desenvolvimento e aperfeiçoamento da
raça, com vista à sua protecção - à semelhança do que acontece com a
bovina mirandesa e outras raças nativas da
região.
"Se
conseguirmos tornar a raça protegida, os agricultores vão ter algumas
contrapartidas financeiras, um contributo para aumentar o número de efectivos e
inverter o processo de extinção", explica, acrescentando que "continuar a
utilizar os burros na agricultura é, também, um postal turístico bonito".
Integrar os
burros nos destinos turísticos do Parque Natural do Douro Internacional é a
principal aposta sugerida pela autora do estudo, para quem "os animais podem
enriquecer as atracções turísticas e servir de meios de transporte para as zonas
de difícil acesso, onde nem os jipes conseguem chegar".
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