(artigo do
Jornal Planalto Mirandês)
Povoado erguido das escarpas do rio Douro, que lhe dá o nome, é o lugar com mais
peso histórico no Planalto Mirandês.
A origem de Miranda do Douro como povoação ainda hoje gera alguma
discussão entre os historiadores, mas os achados arqueológicos fazem-na remontar
à Idade do Bronze. Existem apenas alguns indícios que Miranda do Douro "teria
sido primitivamente um Castro, já da Idade do Bronze"
Sabe-se
que "Miranda do Douro foi uma cidade importantíssima já no
tempo dos romanos, que lhe deram os nomes de Contium, Paramica, Sponcia e ainda
o de Cambetum Lubicanarum".
Os
Serracenos ocuparam-na nos princípios do século VIII, crismando-a com o nome
de Mir-Hândul.
Pertenceu ao convento romano asturiense e, na Idade Média, incluída na Diocese
de Astorga, foi a região de Miranda do Douro, desde Picote à fronteira de
Bragança, colonizada nos primeiros tempos da monarquia portuguesa por frades dos
conventos leoneses de Santa Maria de Moreruela e de San Martin de Castañeda,
situação que se manteve até ao século xv.
Quando
o conde D. Henrique, príncipe de Borgonha tornado Grande de Espanha e um dos
possíveis herdeiros de D. Afonso VI, dela tomou posse, encontrou-a em ruínas,
quase deserta. Assim se manteve até que D. Afonso Henriques, reconhecendo-lhe
importância como marco dos seus domínios em face do Reino Leonês, manda
construir o castelo e concede-lhe carta de foral em 19 de Novembro de 1136, tal
o empenho que o movia de ver o local repovoado.
Em 1117, D. Sancho I renova o foral afonsino e devido ao elevado número de
população em redor do castelo vê-se obrigado a mandar construir uma outra cerca
de muralhas de modo a abranger toda a povoação.
Durante
o reinado de D. Afonso II e na guerra com o rei galego e leonês Afonso IX
(auxiliado pelo irmão do monarca português, D. Pedro) perderam-se muitas terras
acasteladas entre as quais Miranda do Douro. Terras estas que voltariam
para o domínio do monarca português em 1213, graças à intervenção do rei de
Castela. Em 1217 , D. Afonso II concede foral a Miranda do Douro.
D. Dinis sempre em andanças pelas terras fronteiriças manda reforçar as suas
muralhas, torna-a vila e demarca o termo do seu concelho, separando-o do jugado
de Algoso. Concede à vila, em 18 de Dezembro de 1286, novo foral e pede ao
arcebispo de Braga, D. Frei Tello, que construa a sua igreja paroquial de Santa
Maria Maior (1286-1292).
Mais
tarde, em 1325, a povoação renovada e amuralhada é elevada à categoria de Villa,
ad perpetuum. São também deste reinado os primeiros documentos
escritos até agora encontrados.
É do reinado de D. Pedro a tradição de que foi em Miranda do Douro que o
«Justiceiro» convocou o alcaide de Algoso, um tal Soeiro, acusado de uma grande
vilania, pela prática do jus prima noctis, e aí o condenou à morte.
Nas
guerras de D. Fernando com Castela (1371-1383), a vila resistiu a vários ataques
mas acabou por ser tomada.
Assegurada a Independência, após o Interregno, a vila foi recuperada
por D. João I e o castelo, bastante ofendido, restaurado (numa das faces da
Torre de Menagem ainda hoje se vêem as insígnias do fundador da Dinastia de
Avis). Ao sentir a vila carecida de defesa e população converteu-a em couto
de hominiziados.
Foi no
reinado de D. Manuel I que mais se incrementaram as relações comerciais com a
vizinha província de Castela e Leão como consta da própria carta de foral dada
por este monarca em 1 de Junho de 1510.
Em 1545, D João III pede ao Papa Paulo III a criação de uma diocese no nordeste
português escolhendo a vila de Miranda do Douro para sede do seu bispado. O Papa
acede por bula pontífice de 23 de Maio de 1545.
Por
carta régia de 10 de Julho de 1545 o rei D. João III faz de Miranda do Douro uma
cidade com o privilégio de mandar procuradores à Corte. A construção da Catedral
inicia-se neste reinado.
Por
iniciativa do conde de Mesquitela, cabo de guerra de D. João IV, renova-se a
fortaleza, instala-se artilharia e levanta-se um possante baluarte mesmo em
frente ao vale do Fresno (ainda hoje se vêem ruínas).
Em 1640
e durante as lutas da Restauração foi enorme o zelo patriótico do Coroa, para o
prosseguimento da independência. É nesta altura que surge a Lenda do Menino
Jesus da Cartolinha.
No reinado de D João V e durante a Guerra da Sucessão de Espanha, a praça de
Miranda do Douro foi invadida. O governador da praça era o general Luís Machado
auxiliado pelo sargento-mor Carlos Pimentel da Gama que foi subornado pelos
espanhóis. Assim, na noite de 8 de Julho de 1710, o sargento-mor manda abrir a
«Porta Falsa» e dá-se a invasão e ocupação da praça forte de Miranda do Douro.
A
concentração de tropas para a recuperação de Miranda do Douro deu-se a 11 de
Março de 1711. As tropas, 11 regimentos de Infantaria e 5 de Cavalaria,
comandados por D. João Manuel de Noronha (conde de Atalaia), concentravam-se em
Vimioso e em Alcanices (ocupada por forças portuguesas). Ao mesmo tempo, D.
Francisco de Távora, comandante de cavalaria, procedia ao aprisionamento das
barcas da passagem do rio Negro.
A acção
começa no dia 13, às 5 horas da manhã, com um bombardeamento do castelo. No dia
seguinte, após um ataque sobre o flanco da praça, abre-se uma brecha na muralha.
O comandante espanhol pede uma trégua de três dias que lhe é recusada. Vendo o
exército português preparado para o ataque rende-se sem condições.
No reinado de D. José, Portugal recusa-se a aderir ao Pacto de Família,
(1762), e vê-se envolvido na Guerra dos Sete Anos ou do Mirandum.
Estando
a cidade cercada e bombardeada pela artilharia de um corpo de exército, 30 000
homens comandados pelo Marquês de Sarriá, deu-se uma tremenda explosão no paiol
da praça, onde se armazenavam cerca de 1 500 arrobas de pólvora. Desmoronou-se o
castelo, uma parte da muralha e muitas dezenas de habitações. Morreram cerca de
400 pessoas da guarnição e da população. Miranda do Douro rende-se aos
espanhóis.
Dois
anos depois outro rude golpe: transfere-se para Bragança a sede da diocese. O
Papa Clemente XIV ainda procurou conciliar a delicada situação, criando uma
diocese em Miranda do Douro e outra em Bragança (bula de 10-7-1770). A solução
durou pouco. Um novo Bispo mirandês, D. Miguel de Meneses, alegando a pobreza da
pequena cidade ainda em ruínas, resignou, informando a Cúria Romana de que a
cidade não podia ser para ele nem para nenhum outro sacerdote sede de um
bispado.
O Papa
Pio VI, por meio de nova Bula (27-10-1780), integra a diocese de Miranda do
Douro na de Bragança. Muitas das alfaias litúrgicas da Sé mirandesa passam para
Bragança e o povo diz "A sacristia está em Bragança, mas a Sé em Miranda"
ao que contrapõem os bragantinos "Se fores a Miranda, vê a Sé e desanda".
Em 1780, a rainha D. Maria I mandou o engenheiro José Champalimaud de Nussane,
sargento-mor de Infantaria, em exercício de funções em Chaves, realizar o
Projecto de Reedificação da Praça de Miranda do Douro, projecto este que nunca
passou do papel.
Miranda
do Douro é deixada à sua sorte, fechada em si e na sua vil tristeza.
Só em
1955 a cidade volta a ressurgir, com a implementação dos aproveitamentos
hidroeléctricos de Miranda do Douro e Picote e com a ligação pela Barragem de
Miranda do Douro às vizinhas terras de Espanha.
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